quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

2/22/2006 09:42:29 AM

ESTAMOS CHEGANDO?

Pintura de Wayne Thiebaud


Fabrício Carpinejar





Quando estamos viajando, meu filho desde a saída pergunta: estamos chegando? Afirmo que sim, apesar de faltar 300 Km. Cinco minutos depois, lá vem ele com a mesma questão: estamos chegando? Por mais que ande rápido ou vença o trajeto, nada o demoverá da teimosia de querer descer logo ou de ser informado com detalhes de onde está.


Estar chegando revela a ansiedade em definir os relacionamentos. Fala-se da proximidade para afugentar a distância. Não é uma mentira, é uma verdade afoita. Apressamos em dizer que amamos para não conviver com as dúvidas e tampouco gerar suspeitas da legitimidade do sentimento. Há uma pressa pelo final em todo o início e há uma pressa pelo início em todo o final. É obrigatório dizer "eu te amo" para continuar e formalizar o laço.


Talvez seja paixão, mas "eu te amo" já pula da garganta. Talvez seja atração e "eu te amo" fica sentado na primeira fila. Talvez seja carência e "eu te amo" puxa a ponta da camisa e da língua para frente. Não que seja desonesta a declaração, pois não definiremos ao longo dos dias quando se ama verdadeiramente. A precipitação é um modo de garantir, de tomar conta. Não se vive de porta aberta, "eu te amo" é a chave. Ama-se com o quarto fechado. É dito para fazer valer o esforço da conquista, coroar a sedução, assegurar que aquela pessoa é sua, e que não mais corre o risco de perdê-la. Caso nenhum dos dois fale, amarga-se uma sensação de inutilidade e de desprezo.


Não existe como sair ileso da encruzilhada: se não apregoamos o "eu te amo" somos insensíveis, se declaramos toda hora pode se tornar um aceno, mero cumprimento. É preciso cuidar para que não seja usado sem vontade. Um selinho não é suficiente para mandar a carta. Sem desejo, o "eu te amo" é saudação de lápide, entra-se no território da proteção e da rotina, para se despedir de amar. Servirá para afastar o beijo quando deveria prolongá-lo. E as atitudes, e as outras palavras não contam?


Quantas vezes proclamamos o amor precocemente? Antecipamos para que de fato venha. Prometemos para depois ver se acontece. Ainda que incomparável, o amor se faz pela comparação com experiências anteriores. Define-se pela sua força em sobrepujar as lembranças e relações anteriores. É a superação do que foi vivido que valida ou não sua intensidade. Não representa o amor, e sim uma nova tentativa de amar.


Será que o amor não é tão-somente vontade de amar?


Estou chegando. Nunca chegarei, amor é estar a caminho.

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