quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

2/23/2004 09:32:04 AM

CADEIRA DE BALANÇO

Fabrício Carpinejar



Ninguém se recosta numa cadeira de balanço se não pretende pensar. Ninguém dorme sossegado em suas plumas de madeira. Não é um móvel qualquer, um cômodo, um assento. Ninguém passa o tempo nela, mas é o tempo que se anula, como uma lesma que se confunde com o muro, como um vento que migra para a maresia. Uma cadeira de balanço é um cavalo apeado, que se movimenta unicamente pelas narinas, resfolegando, expirando a corrida recém feita. Um pouco mais do que uma escultura, um pouco menos do que um homem. Ela é uma varanda no quarto, uma janela aberta, uma veia latejando. Ela se entreolha enquanto se movimenta. Uma cadeira de balanço não é silenciosa. Rumina, não fala. Ouvido das frestas. Uma torneira chiando de madrugada. Uma cadeira de balanço nunca fica nua. Mantém o xale de crochê aos ombros. Protege os seios. Uma cadeira de balanço é como sentar no colo da mãe, da avó, da bisavó. Pede-se licença. Ela tem o quadril largo de praça e suas duas pernas são enxadas descansando. Seu ritmo é outro, todas as peças parecem inclinar e servir suas rodas. Uma cadeira de balanço é um chapéu transformado em tranças de feltro. Uma charrete vista de lado, uma árvore encurvada em guitarra. As crianças que brincam nela logo pulam porque uma cadeira de balanço é também corrimão de escada. É o primeiro degrau, o último sopro da velhice. Eu fui amamentado em uma cadeira de balanço, embalei meus filhos entre canções e toques de recolher, meu avó morreu recolhido em seus braços.

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