quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

6/26/2005 10:36:05 AM

TRIBUNA DO BRASIL, Saber, página A7.

Brasília (DF), 20/6/05


A TERCEIRA MARGEM DA POESIA

O gaúcho Fabrício Carpinejar lança livro duplo, que investiga o amor em suas oposições, e comprova força entre os escritores brasileiros contemporâneos


Mateus Baeta


Não é fácil contextualizar a poesia nos dias de hoje. Mas ninguém melhor que um poeta para fazê-lo. "A poesia não é um passatempo, uma brincadeira, é uma necessidade. Fui um menino asmático, com problemas de dicção, feio e desajeitado. A poesia me defendeu, foi minha arte marcial", conta Fabrício Carpinejar. Seria apenas um detalhe em uma biografia não fosse Fabrício o responsável. Dono de obra invejável, com seis livros lançados e prêmios internacionais no currículo, o gaúcho Carpinejar é grande revelação, com voz destacada entre os contemporâneos.


O livro mais recente, Como no Céu/ Livro de Visitas (Bertrand Brasil, 224 págs.), lançado este mês, ratifica a opinião dos especialistas, e dos interessados. São duas obras, na verdade. E elas se valem de oposições para solidificar sua estrutura. Fabrício pela primeira vez fala apenas do amor em sua banalidade. Os dois livros juntos contam a história de um casal, um homem, uma mulher, o cotidiano e só. Mas Como no Céu é claro, solar. E Livro de Visitas é feito de sombras. O primeiro pode ser lido normalmente, e vai até a metade do volume. O segundo começa de trás para frente e segue até alcançar o ponto onde o outro parou.


O próprio design do livro explicita as diferenças. A capa, de Como no Céu, é um girassol aberto em pétalas; a contracapa, de Livro de Visitas, é o outro lado da mesma flor, suas costas, sobre tons escuros. Juntos, os dois são um esforço rumo ao equilíbrio. "Nossos sentimentos são contraditórios, mudamos toda hora de opinião, podemos ficar tristes na mais alta alegria e alegres na mais insana tristeza. O amor é bipolar, os piores sentimentos acontecem das mais puras intenções. O ciúme, por exemplo, ocorre por amor e pode destruir o próprio amor. Os dois livros carregam essa condição misturada", resume Fabrício.


Com linguagem caminhando em direção à realidade, Carpinejar mudou seu ponto de vista. Ele não é mais o filho. É marido, assumiu a paternidade. O resultado é duramente próximo. É possível achar lembranças próprias em cada verso. E as reminiscências muitas vezes dão a impressão de serem parte do poeta, de sua biografia. Mas Fabrício alerta: "Eu falo a verdade mentindo. O que imagino é também experiência. O que sondei é também experiência. O que observei também é meu. O poeta não simplifica a vida, ele a intensifica". Cava espaço, assim, para a poesia, feita de forma corajosa. "As pessoas não buscam um livro para fazer a cabeça, buscam um livro para fazer seu coração".

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