quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

6/24/2005 11:10:52 AM

A SOLIDÃO CUSTA CARO

Pintura de Paul Klee


Fabrício Carpinejar





Ela vai sair de noite. Reserva o dia para se arrumar. Faz chapinha por R$ 30. Faz as unhas, a preço de R$ 20. Faz depilação com R$ 30 a R$ 60. Compra roupa com R$ 200. Arranja um par de sapatos a R$ 100. Na brincadeira, contando por baixo, gasta bem mais do que um salário mínimo. A arrumação aumenta a expectativa de conseguir um par, um laço afetivo na festa ou na balada. Aumenta também a exigência - não será qualquer um a desarrumá-la. As amigas vão juntas para disfarçar a solidão e o desejo. Durante o convívio, dança avulsa com a dispersão de um farol. Busca a si mesma em cada um que circula. Quando a gente anseia amar a gente se busca, não busca o outro. É a identificação que gera depois a diferença. As horas correm, o sono chega, a cota de consumação termina. Apesar da conversa alta, do som predileto, das indiretas, nada surge. Nem bêbada fica. Produziu-se como nunca e passa em branco. Os homens não reparam, em sua maioria, o investimento que uma mulher realiza em nome de uma possível paixão. Quantas horas e ansiedade para ficar daquela forma? É como se ela nascesse pronta. Aliás, a mulher tem o dom de tornar natural o seu próprio esforço, de transmitir indiferença quando está ligada aos suaves movimentos do mundo com todo os poros. Imagine a frustração de quem se preparou inteiramente para aquele momento, viveu as vésperas como uma guinada decisiva e não acontece sequer um encontro digno de ser anotado na agenda. É desesperador. Pense ainda que a mulher pode estar pagando uma babá para ficar com o filho, raramente se arrisca a procurar novos relacionamentos e decidiu ceder à insistência das colegas que a viam muito solitária. Após a saída, arrepende-se de tentar, sua esperança se rareia com as dificuldades, pois é tão extenuante transformar um caso em casa. Definir no calor da hora, com parcas palavras, uma atração que renda uma semana. Hoje andar de mãos dadas é mais complicado do que descolar um beijo. Não adianta subestimá-la dizendo que ela está caçando. Está procurando, que é bem diferente. Caçar é matar a fome, já ela quer aumentar a fome acompanhada. Não adianta zombá-la dizendo que é carente. A carência é uma virtude da fidelidade. Essa mulher entendeu, infelizmente, que a solidão custa caro.

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