ESCONDE-ESCONDE
Da série "A infância não atravessa a rua sozinha"
Gravura de Vidal
Fabrício Carpinejar
No pátio, quando os frutos salivavam pássaros, eu brincava de esconde-esconde como a astúcia de quem sobe em árvores. Contava até dez grudado no avental do abacateiro. O mundo parecia que seria descoberto naquela disparada. O meu irmão caçula se guardava como ninguém. Eu explorava os vãos das pedras, os corredores, os telhados, as parreiras, as moitas e nada. Não o achava e a mãe pedia para entrar: "é noite!" Deduzi que o apelo dela o faria deixar seu segredo. Ele era pequeno, com o dom de desaparecer e prender a respiração. Um crucifixo escondido na camisa das lajes. Um poço enamorado das raízes fundas. A conspiração áspera do veludo. Nem o nosso cachorro o farejava. A brincadeira que começava com a euforia logo se transformava em preocupação e medo. No final, eu já estava chorando. Gritava que não havia graça, que desistia, que a mãe estava preocupada. Até hoje meu irmão tem um silêncio demorado. Longo e generoso. Ele não sai fácil de si. Aprendi a perdê-lo no pátio, aprendi a desistir de minha inocência, que nunca se deu bem com respostas demoradas.
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
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