quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

12/10/2005 09:48:12 AM

O AMOR É PREVISÍVEL

Pintura de Van Gogh


Fabrício Carpinejar





As mulheres reclamam que os homens não são imprevisíveis. Deveriam reclamar que os homens não são previsíveis. Falta previsibilidade nesta vida. Pode soar estranho, mas o amor é previsível, ele quer ser previsível, ele faz tudo que é loucura para ser depois previsível. O homem sempre recebe sinais para ser previsível. É só reparar no vestido que ela mexeu, experimentou e não comprou na loja. Ela chegou a soletrar seu tamanho para ele. Chegou a deixar separado por 24 horas. Se ele der de presente a peça, ela dirá com a maior das espontaneidades: - que surpresa. Mas vai dizer que não foi previsível? Se ele não comprar, ela ficará reclamando que ele não é imprevisível, apesar de ter sido. Inverta os personagens e o mesmo acontece. O homem escolhe o que gosta e desiste da compra no balcão. Uma mulher atenta não deixará a pergunta sem resposta.


A previsibilidade não é negativa. Assim como a rotina não corresponde ao tédio.


Os casais quase se matam de ânsia, quase se suicidam, gritam em público, perdem o pudor, transam em parque ou em banheiro público, alucinam com palavras durante a noite, por um único motivo: para estar um dia lado a lado, de chinelos e abrigo, abençoados pela quietude da compreensão. Com a certeza de terem feito o máximo para ficarem juntos.


O que a paixão almeja é a sua aposentadoria. Transformar-se em respeito sensual, em amizade sensual, em intimidade. De vidro, que pode ser quebrado com facilidade, amadurecer em cristal, com a altura do vento.


Não é a aventura, não é a mudança repentina de hábitos, não é o zoológico das vontades, a previsibilidade que é deliciosa. Insinua que se agiu como ela esperava. Insinua que o homem teve a capacidade de leitura, de se importar com o que a mulher aguardava para cumprir linha por linha da caligrafia dos lábios. Insinua que a expectativa foi saciada e se tornou esperança. Insinua que os dois se entendem perfeitamente, que um busca agradar ao outro, sem parar muito tempo diante do espelho na sala de estar.


A xícara de café com um pouco de leite de manhã, o sexo na sesta, o cinema no final de quarta, a leitura de jornais por cadernos, a mão desviando dos farelos da mesa para segurar a mão dela, o abraço de lado, o beijo soprado são previsíveis. É possível saber a hora exata da cena. Saber antes não diminui a intensidade. Até aumenta. Nada como amar em dobro, na espera e na confirmação.

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