quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

11/18/2006 09:33:56 AM




ELA BEIJA OUTRO CARA PENSANDO EM MIM

Colagem de Jean Dubuffet

Do Consultório Poético

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Fabrício Carpinejar





"Oie, Carpinejar! Tudo bom?


A sua fama de conselheiro amoroso está chegando ao Nordeste. E eu, com toda humildade, peço seus conselhos para este coração sofredor.


Minha história começa praticamente há um ano, quando recebi um e-mail de um site de relacionamentos e resolvi me cadastrar nele. No mesmo dia, encontrei a mulher da minha vida.


Ela, psicóloga, 23 anos na época. Começamos a conversar e perguntei o que ela estava procurando naquele site, e ela me respondeu que era o menino que Deus tinha prometido a ela. Marcamos um encontro e foi paixão à primeira vista.


Ela não queria nada sério. Tive de ficar numa marcação cerrada durante um mês e meio, colocando idéias na cabeça dela de que era melhor assumir o namoro. Na véspera de Natal, marcamos para ir um na casa do outro e todos perguntavam por que a gente já não assumia o namoro. Dito e feito: começamos a namorar naquela data festiva. Foi um ótimo presente, já que eu estava praticamente há dois anos sem um namoro sério, somente ficando ou arranjando namoricos fajutos.


Vivemos um conto de fadas, ela sempre dizia que eu era a 'encomenda', que era tudo que ela sempre sonhou. E eu repetia a mesma coisa.


A gente gosta praticamente das mesmas coisas, dividíamos os mesmos sonhos. Eu estava no começo de carreira em engenharia, ela também estava no começo de carreira em psicologia. Fomos descobrindo que tínhamos muitos amigos em comum e que todos adoravam saber que estávamos namorando. Diziam que um completava o outro. Ela sempre teve relacionamentos-relâmpago, que a família dela não aceitava. No meu caso, a família dela me adorava.


Entretanto, dava para contar nos dedos a quantidade de garotas que tinham passado na minha vida. Ela questionava muito essa minha falta de experiências amorosas e a falta de flexibilidade diante da 'enorme' vivência dela.


Começamos a ter pequenas brigas: quatro para ser exato. Ela tem um temperamento forte, dominador. Ela é de Áries e eu, de Escorpião. É briga na certa, mas sempre conseguimos superar. Mas eu também não nego fogo. Se eu tinha alguma discussão no trabalho, sempre levava a briga para rua, nunca deixei onde começou. Se fosse tão simples deixar nossos problemas debaixo da porta... Em um desses dias, lembro como hoje (6 de setembro), tivemos uma discussão feroz e ela resolveu ficar indiferente comigo até o dia 5 de outubro, quando ela resolveu terminar. A partir deste ponto, começa a minha aflição.


Eu começo a fazer todo tipo de 'chantagem emocional': ligar para ela, mandar mensagens de texto para o celular. Enfim, usei quase tudo e tinha já praticamente desistido dela. Há três domingos, ela me encontrou num site de bate-papo e pediu para a gente conversar no MSN. Eu não pedi a chance de tentar reconquistá-la e disse o que sentia ainda por ela: se ela assim desejasse poderia ser a minha única rosa pelo resto da minha vida. Ela respondeu: 'Não sei que te dizer', pedi que ela falesse com sinceridade, e ela novamente respondeu: 'Com sinceridade, gosto muito de você, mas não sei o que te dizer'. Vi uma janela e, na terça, mandei flores para ela. Ela não ligou de imediato para mim, mas também não estava esperando algum tipo de resposta. Mas ela agradeceu no mesmo dia, no MSN, dizendo que me adorava. Pois bem, neste meio tempo arranjei uma garota e ela estava tapando um buraco na minha carência afetiva. Na semana passada, eu a encontrei novamente no MSN e ela comentou que está com um rapaz, mas o beija pensando em mim! Ainda confessou que gosta muito de mim, mas quer deixar as coisas acontecerem. Também não posso te negar que estou na mesma situação que ela, já que estou com outra garota - e por sinal tenho que terminar com ela o quanto antes, para não ficar uma coisa mais séria.


Cara! Juro a você: não sei mais o que fazer. Como uma pessoa joga na sua cara que gosta de você, mas ainda assim fica com outro? Será que é isso que o povo chama de 'tempo'? Devo continuar insistindo? Ela me quer ou não? Cara... Preciso dos seus conselhos com urgência!


SOCORRO!


Abraços,


Rubens"



Nossa, Rubens, quanto sofrimento à toa.


Eu não aconselho afirmar que é a mulher de sua vida, faz um depósito exagerado na relação. O certo é chamá-la de mulher de uma fase de sua vida, pode ser que seja de várias fases de sua vida, tanto melhor.


Iniciou o namoro no papel submisso e não houve mudança de postura. É sempre o que vai atrás, o que se perturba, o que sofre, o que espera um sinal. Ela é quem manda e desmanda, define a direção e o curso da história. Deveria ter ocorrido alguma inversão de papel. Ela se mostra indiferente e, logo depois, carente, a transtornar suas razões. Corre no encalço dela como um louco e sua lâmina desorientada de palavras. Viraste um grude, que é o personagem mais abominado pela história feminina de todos os tempos. Aceitável sacrificar o orgulho por um amor, mas não a inteligência da sedução e a autonomia.


Desperdiça energia à toa. E, ainda por cima, desvaloriza as mulheres com que anda: "namoricos fajutos", "tapar um buraco de minha carência afetiva", etc. Ela percebe seu desinteresse por outras e se sente segura para fazer o que quiser contigo e quando quiser.


Não é mais paixão, é sadismo. Digo mais: vocês criaram uma atração de gato-rato, uma fixação pelo atrito. Quanto mais desespero, melhor. Quanto mais ela diz que fica com um cara pensando em beijá-lo, mais você a quer. Não é romance, e sim uma relação de poder. Ela quer manter o poder sobre suas decisões; o poder é charme, é posse, é sexual. Não acho que ele o ama ainda... O que identifico é tortura.


Sua desvantagem revela-se inclusive no reconhecimento menor de sua bagagem: "Ela questionava muito essa minha falta de experiências amorosas e a falta de flexibilidade diante da 'enorme' vivência dela".Desde quando o número de mulheres que amou significa que tem ou não domínio? Um dedo com aliança pode superar uma mão de aventuras. Uma mulher pode ter se relacionado com trinta homens e não encontrar nem metade de seu prazer. Faz favor, meu amigo, quilometragem funciona só para carro. Corpo é qualidade.


Eu desencanaria para salvar a estima. É ela que necessita reconquistá-lo, não o contrário. Deixaria que ela sofresse um pouco. Não necessariamente para voltar, para entender ao menos o seu sofrimento.


Envie carta com suas dúvidas de relacionamento para carpinejar@terra.com.br

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