ALÉM DO PORTÃO
Gravura de Miró
Fabrício Carpinejar
Conheci uma mulher que era bem avara em seu jardim. Escolhia o verde essencial, umas flores discretas e ínfimas, de intimidade prosaica, para não chamar atenção dos vizinhos. Roseiras e orquídeas, nem pensar. Onze horas, de vez em quando, para se lembrar do almoço. Sua vaidade era a bengala, que a equilibrava na janela. Ela gostava mesmo de ser generosa para fora de casa, de plantar ameixeiras e pitangueiras no canteiro da frente, depois de seu portão. Quando as árvores se enchiam de frutos, as crianças ficavam ouriçadas, com medo de serem advertidas, cabuladas e ofendidas pela dona. Não, ela dizia, podem ficar à vontade, levar quantas quiser. As frutas são da rua. Ela ria desavergonhada, com uma safadeza do bem, germinada muito além do vaso.
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
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