TRÊS MULHERES
Desenho de Fra Angélico
Fabrício Carpinejar
I. Ela não queria anotar a reunião na agenda. Torcia para que nenhum convite viesse, que a obrigasse a notas, alertas e avisos. Ao final do ano, recolhia a agenda vazia, intacta, quase sem marcas, e sorria orgulhosa de não ter feito nada. Sentava em sua mesa na varanda, chiava lentamente a xícara de café, abria o ano passado e escrevia seus poemas como lembranças que se atrasaram.
II. Ela nasceu viúva, havia me dito. Desejava casar para ficar solteira. Desejava se separar para ficar casada. Desejava enviuvar de novo para nascer. Nunca encontrou homem que lutasse por ela. Amou por descuido o seu próprio desejo.
III. Ela não se preocupava com as trancas da porta, não se levantava para verificar se estava segura. Dava-se bem com o escuro, em ser vulgar em segredo. Xingava a si mesma com facilidade. Ofendia-se, sabia que depois de usar tranças tudo seria tarde. Tinha seu retrato como confidente. Reparando a ausência de frestas, a casa vedada, abriu uma torneira como uma janela. Despertou sem amanhecer.
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
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