quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

9/11/2005 11:51:31 AM

ENCRUZILHADA

Pintura de Magritte


Fabrício Carpinejar





Uma leitora mineira, Magda, de 22 anos, manda uma carta, avisando que namora sério um paulista de 25 anos e está em dúvida se aceita possível mudança com o rapaz. Leonardo foi aprovado em concurso de Brasília e gostaria que ela o acompanhasse. Ela pergunta: É cedo para esse passo? Existe uma idade certa para se comprometer de fato?


Posso garantir que não há idade certa, há desejo na hora certa ou desejo na hora errada. O desejo na hora errada envelhece antes de gozar a juventude, se apaga antes de acender. O desejo depende da pontualidade para se transformar em casamento. Talvez seja a hora certa de desejar. Daqui a dois anos, o desejo pode ser nostalgia ou amizade.


Explica-me que namora sério, as intenções são as melhores possíveis (casa, jardim e crianças) e não existe nada que possa impedir a experiência. Seu problema é justamente a falta de problema. O terror de dizer sim e deixar a família, o emprego, a cidade, o que é conhecido e desde sempre foi seu ponto de referência. Pelo jeito, gostaria que demorasse mais a chance da residência em conjunto. A decisão nos apequena. Vive um estado de descrença (não acredito que aconteceu) e de pavor (não sei se faço a troca). Misto de esperança e ceticismo. Uma esperança cética própria da criança, que cobiça o novo brinquedo na vitrine mas não gostaria de largar o que possui nas mãos.


Escolha significa renunciar algo, para valorizar a encruzilhada e o passado. Não tem como trafegar em duas ruas e vidas simultaneamente.


Vou contar uma história que talvez a tranqüilize. Faz de conta que ele está no pedágio pedindo carona. Passa com seu carro por ali. Sua formação a ensinou a não arriscar e a se proteger, a não conversar com estranhos, a não permitir inconvenientes, certo? A atitude comum seria pagar o bilhete, cruzar a cabine e desprezar a figura simpática e desesperada com o polegar abanando. Porque pensa apenas em seu medo, no medo de oferecer ajuda e, em troca, se deparar com um louco ao seu lado. Mas não cogita que o caroneiro sofre de medo idêntico e até maior, que pode estar entrando em um carro com uma louca e terminar refém do desconhecido.


Mude a perspectiva, saia de si, tome o lugar do outro e encontrará a resposta. Ele também sofre o receio de começar uma vida nova, mesmo que tenha feito o convite em aparente coragem. Não é só você que está optando, ele também fará sacrifício e abandonará sua cidade, família e referenciais. Não é uma escolha unilateral, terão a possibilidade de escolher juntos. Toda escolha partilhada já é amor.


Moral da história: se não dá chance ao azar, não dá chance para a sorte.



O "Consultório Poético - para complicar o que já estava complicado" recebe colaborações. Pode mandar cartas com suas dúvidas de relacionamento. Tentarei responder aqui ao longo da semana. E-mail: carpinejar@terra.com.br

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