quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

8/9/2004 12:07:08 PM

DISTRAÇÕES FATAIS


Fabrício Carpinejar


Sou estrábico pelo desejo de estar em dois lugares ao mesmo tempo. Em minha viagem para Santa Rosa, cidade a 370 km da capital gaúcha, quase furto um carro por distração. Explico: descemos (eu e o motorista) em um posto para comprar água. Fiquei na rua pensando a falta de pensamento. Tremi o anzol do frio no pescoço e decidi buscar um blusão no carro. Abri a porta e fui entrando e nada do agasalho no banco. De repente, um senhor barbudo grita: "o que está fazendo, ó meu?". Entrei no veículo errado. E o pior que o tipo e a cor do carro eram diferentes daquele que eu vinha. Não tinha nem desculpa ou licença poética. O dono poderia me socar para depois pedir explicação. Foi sorte, que é o juízo de quem não sofre com o juízo. O pior ainda aconteceu em minha adolescência. Em uma daquelas iniciativas frustradas de me tornar um esportista, planejei ir de bicicleta da casa até a escola, o equivalente a quarenta minutos de ônibus. Eu descia na contramão pela maior possibilidade de desviar do congestionamento. Escapava dos carros, mas me esqueci que existiam pedestres atravessando a rua e que olhavam justamente pelo lado contrário da minha velocidade. Escorregando pela lomba da Protásio Alves, em Porto Alegre, estalando o vento no beiço, faceiro com o impulso e com os pedais girando sem esforço, vejo o que não vi, e passo por cima de alguém vacilando entre a calçada e a rua. Esse alguém era um brigadiano fazendo o papel de sinaleira. Não preciso dizer que não cheguei na escola.

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