Jornal do Brasil, caderno de Esportes, 12/06/06
ZICO É MANGÁ
Fabrício Carpinejar*
Especial para o JB
Devo parte das minhas cáries da infância a Arthur Antunes Coimbra, o Zico. Ele foi de longe a imagem mais difícil de ser encontrada no Futebol Cards, figurinhas do final dos anos 70 que não vinham em envelopes, e sim embaladas nos chicletes. Eu não dava conta de mascar as enormes barras rosas, maiores do que a minha mão de menino de oito anos. Arranjei um pote de bolachas na sala para depositar as centenas de chiclés. O galinho de Quintino nunca apareceu em minha coleção. Ainda me recordo abrindo desesperado os papéis à caça de seu rosto. E seu rosto me driblava e vinha todo o esquadrão implacável do Flamengo: Paulo Cesar Carpegiani, Tita, Júnior, Andrade... Menos ele.
Zico grudou em minha memória, no meu kichute de boleiro. Queria ser igual, um falso baixinho - na verdade ele não era pequeno, tomava impulso com a bola nos pés, capaz de trocar os refletores do Maracanã com a cobrança de uma falta e fazer tudo brilhar na garganta mais do que permitido pela voltagem da cidade.
Chorei por Zico nas Copas de 82 e 86. Sempre o considerei melhor do que Maradona. Teve uma carreira vitoriosa no Flamengo, equivalente a do Pelé no Santos. Não levantar a Taça Jules Rimet tornou-se a brecha, a lacuna de sua história. Mas Puskas nunca ganhou, Eusébio nunca ganhou, e não foram esquecidos por isso.
Hoje Zico estará no banco. Estranho vê-lo sentado ao lado dos reservas do Japão, a comandar a seleção nipônica contra a Austrália. No terreno dos insetos, a partida será algo como abelhas enfrentando vespas. Times esforçados sem um gênio reconhecível. Zico poderia ter sido desenhado por Maurício de Sousa, como agora é Ronaldinho Gaúcho. Porém, virou um Mangá. E não desistiu da Copa. Nem vai desistir.
Vinte anos depois, procura como eu completar uma ausência em seu álbum de figurinhas.
* Fabrício Carpinejar é jornalista e escritor, autor do livro de crônicas "O Amor Esquece de Começar" (Bertrand Brasil, 2006)
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário