quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

6/12/2006 08:02:32 AM

Jornal do Brasil, caderno de Esportes, 12/06/06


ZICO É MANGÁ


Fabrício Carpinejar*

Especial para o JB





Devo parte das minhas cáries da infância a Arthur Antunes Coimbra, o Zico. Ele foi de longe a imagem mais difícil de ser encontrada no Futebol Cards, figurinhas do final dos anos 70 que não vinham em envelopes, e sim embaladas nos chicletes. Eu não dava conta de mascar as enormes barras rosas, maiores do que a minha mão de menino de oito anos. Arranjei um pote de bolachas na sala para depositar as centenas de chiclés. O galinho de Quintino nunca apareceu em minha coleção. Ainda me recordo abrindo desesperado os papéis à caça de seu rosto. E seu rosto me driblava e vinha todo o esquadrão implacável do Flamengo: Paulo Cesar Carpegiani, Tita, Júnior, Andrade... Menos ele.


Zico grudou em minha memória, no meu kichute de boleiro. Queria ser igual, um falso baixinho - na verdade ele não era pequeno, tomava impulso com a bola nos pés, capaz de trocar os refletores do Maracanã com a cobrança de uma falta e fazer tudo brilhar na garganta mais do que permitido pela voltagem da cidade.


Chorei por Zico nas Copas de 82 e 86. Sempre o considerei melhor do que Maradona. Teve uma carreira vitoriosa no Flamengo, equivalente a do Pelé no Santos. Não levantar a Taça Jules Rimet tornou-se a brecha, a lacuna de sua história. Mas Puskas nunca ganhou, Eusébio nunca ganhou, e não foram esquecidos por isso.


Hoje Zico estará no banco. Estranho vê-lo sentado ao lado dos reservas do Japão, a comandar a seleção nipônica contra a Austrália. No terreno dos insetos, a partida será algo como abelhas enfrentando vespas. Times esforçados sem um gênio reconhecível. Zico poderia ter sido desenhado por Maurício de Sousa, como agora é Ronaldinho Gaúcho. Porém, virou um Mangá. E não desistiu da Copa. Nem vai desistir.


Vinte anos depois, procura como eu completar uma ausência em seu álbum de figurinhas.


* Fabrício Carpinejar é jornalista e escritor, autor do livro de crônicas "O Amor Esquece de Começar" (Bertrand Brasil, 2006)

Nenhum comentário:

Postar um comentário