quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

5/10/2004 10:39:51 AM

PARA MINHA ANA

que completa 35 anos hoje

Poema inédito - Fabrício Carpinejar





Agora, vejo minha mulher

ao meu lado, seu corpo

já passou pelos filhos,

os filhos já passaram pelo seu corpo,

a pele reluziu, dilatou-se,

voltou ao estado

de contenção e apuro,

e aos poucos se mantém

recolhida como um carretel

e sua corda de amanhecer.


Ela escolheu envelhecer comigo.

Pode ter sido compaixão pela

minha falta de jeito,

acaso ou um acidente

dos cabelos lisos e oleosos.

Ela escolheu envelhecer comigo.

Pode ter sido amor,

simpatia ou alguma

perda fora de mim

que despertou suas perdas.

Pode ter sido a idade que pedia um marido,

sei lá, o marido pedia uma idade.

Ela escolheu e aqui fez sua noite.

Suas mãos se toldam em uma tenda

quando alivia minha barba

de outros odores que não o seu.


Eu rezo para não ter paz

no corpo dela.

Sua boca é vinho no inverno,

figo no verão.

Seus olhos ficam flutuando sozinhos,

a nudez para cima, ondulada

como as linhas da montanha.

Expondo-se ao sol

com uma dispersão selvagem.

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