quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

2/27/2006 09:52:36 AM

PARA QUEM PERDEU...

Revista Cláudia, edição de fevereiro de 2006


CONSULTÓRIO SENTIMENTAL ON LINE - AS PERGUNTAS QUE OS HOMENS MAIS FAZEM SOBRE AMOR E SEXO


Ao me propor a responder a questões amorosas no meu blog, jurava que a maioria da correspondência seria feminina. Me enganei redondamente. Choveram e-mails de homens. Aqui, entrego oque passa pela cabeça deles - e dou os meus palpites


Fabrício Carpinejar | Fotos Karine Basilio





Quando jovem, eu era o melhor amigo das colegas. Queria ser o namorado de muitas delas, mas me tornei involuntariamente um conselheiro. Ou seja, o último da lista, mesmo porque nunca vi nenhum cupido garanhão. O conselheiro significa o ponto morto dos relacionamentos. A velocidade e a aventura estão nas marchas (alivia-me pensar que, pelo menos, eu não era o freio de mão). Representava o cara sensível, que consolava o coração alheio e não sabia esvaziar o seu. O cara chamado nas emergências para enxugar lágrimas da turma e trancar as suas por toda a noite. O que ouvia e não era ouvido. O cara que namorou tarde porque não declarava seu amor, sob hipótese alguma, esperava ser reconhecido e descoberto por aquela que amava. Essa pré-história afetiva definiu meu caráter. Não sou psicólogo, nem terapeuta, muito menos psiquiatra. Perdoem-me os especialistas. Sou poeta e ainda assim tenho dúvidas (risos). Aliás, sou só poeta por amar as dúvidas. Inspirado no CONSULTÓRIO SENTIMENTAL, do DIÁRIO DA NOITE, em que o jornalista Nelson Rodrigues escrevia, no fim dos anos 40, decidi abrir o Consultório Poético no meu blog, com o subtítulo "Para complicar o que já estava complicado". Passei a receber e-mails sobre questões amorosas e afetivas e a escolher uma das dezenas de correspondências para oferecer palpites e mostrar caminhos. Esperava que o público feminino fosse lotar minha caixa de entrada. Qual a minha surpresa ao perceber que a maioria da correspondência, de lamentos e desabafos, vinha de homens. Sim, os homens não são mais as pedras frias e egoístas no fundo dos rios. Eles se abrem com uma franqueza absurda, desnorteados, preocupados em agradar e assegurar um namoro ou um casamento. Não duvido que Santo Antônio esteja recebendo hoje mais promessas masculinas que femininas. Apresento as preocupações recorrentes da ala masculina no Consultório e as minhas considerações sobre elas.


Eu me mordo de ciúme.

O ciúme é tão forte que se costuma falar "ciúmes", no plural, mesmo quando é singular. Ciúme não é ruim desde que não revele autoritarismo, desde que seja pertinente a uma situação, não a toda hora, como uma paranóia despropositada. Precisa ser economizado para os momentos de ultrapassagem dos limites, senão vira fantasia mórbida. Se ele surge sempre, sem motivo aparente, é irritante e inconveniente. Poucos suportam. Quando aparece raramente, indica interesse e carinho. É bom dizer para quem se ama: "Quero que seja livre em mim, não de mim". Tirar a liberdade do outro é sacrificar a própria liberdade. Com o ciúme exacerbado, você procura um motivo para se separar, não para permanecer junto. Procura a suspeita, não a lembrança. Procura o fim do amor e esquece de viver o que o gerou. Com medo de sofrer uma eventual separação, antecipa a separação para sofrer tudo de uma vez. Desperdiça-se a vida em um estado permanente de desconfiança. O que é pior: conviver com a amargura de traições sucessivas infladas pela imaginação ou ser traído? Ainda acho que correr o risco da traição é mais confortável e justo do que pressenti-la a cada momento. Qualquer um pode ser traído, mas não é possível tomar a infidelidade como regra. Acentua o clima de desgaste e de esgotamento, de confronto e de expiação, que levará ao término da lealdade e, infelizmente, às autênticas traições.


Ela gosta de outro.

No amor, a paciência é inimiga da perfeição. Não se nasce para assistir ao amor, mas para contracená-lo. Nunca aceite o papel de conselheiro, que vai torná-lo inofensivo. Dificilmente ela observa um amigo como um provável namorado. Se achar que conhece você, não existe mais possibilidade de encantamento. Seja misterioso, imprevisível. Ela terá que ficar intrigada, ávida por descobrir o que deseja. Não deixe que descubra nunca! Use o humor para vê-la rindo de um jeito bonito. Procure elogiar detalhes, algo que não se repara facilmente. Evite desancar e criticar os amigos de sua musa, ela passará a defendê-los. Faça de conta que o outro homem nem existe para ela aprender a se desinteressar por ele.


Par perfeito. Será que existe?

Não, não existe. Essa história de alma gêmea é incesto. A gente não nasce para casar com a nossa imaginação, senão ficaríamos solteiros a vida inteira. O importante é encontrar uma mulher que nos desafie, nos questione, nos faça pensar diferente. Amar é tirar férias de si mesmo, conhecer outros hábitos e gostos, descobrir que se aprecia, por exemplo, o odiado chuchu. O que não é planejado emociona bem mais do que confirmar expectativas. Ser elogiado constantemente é chato, cheira a bajulação. Não se deve procurar uma mulher para dizer amém, mas para interromper o narcisismo e derrubar os deuses. Sou favorável à espontaneidade e improvisação. Ter algo para aprender é motivo de festa.


O sexo é bom, mas depois dele não há conversa. Ou o sexo é ruim, mas a conversa é boa.

A relação vai bem na cama, mas no momento de olhar para o teto fica-se com vontade de sair dali e ser astronauta. Nenhum dos dois fala. Ambos tartamudeiam. A química da pele queima, só que a boca não funciona para outra coisa a não ser beijar. Como se portar? Tirar proveito do humor, brincar, atiçar papéis. Procure descobrir o que ela curte, solte curiosidades, confesse suas taras. Ousadia é melhor do que omissão, não importa a dosagem. Ninguém pede desculpa pela ousadia, mas é possível se arrepender pela falta dela. Em primeiro lugar, não deixe o silêncio tragar o casal. Fale do incômodo do próprio silêncio, se for o caso, para interceptá-lo. Está provado, mulheres gostam de homens divertidos. Rir já é voltar a transar. Fazer sexo é também conversar. O sexo não acontece somente no quarto. Inicia-se antes, no jantar, no cinema, nos olhares prolongados, nas mãos dadas, no jeito de contornar o rosto e o pescoço. A véspera determina a umidade. O homem também tem receio de ser enganado com o orgasmo. Um orgasmo fingido é o que mais o abala.


De que modo definir se ela está gozando? Pelo ritmo. O que é contido, sincopado, fica desgovernado ao final. Uma mulher se expulsa na hora H. Ou melhor, na hora M. Ela se derrama e a cama é escassa para recebê-la. Uma mulher quando finge continua segurando as rédeas. Uma mulher quando goza deixa ser levada pelo animal do instinto. Mas não questione nada. Se desconfiar que ela não teve arrebatamento, recomece em vez de perguntar. O orgasmo aumenta com a soma de vacilações e dificuldades. Uma mulher que demora mais para atingir o prazer será justamente a que terá maior prazer depois.


Casamento é para toda a vida?

Casamento é para toda a vida da relação, não quer dizer que seja para toda sua vida. Relacionamentos podem morrer antes. Depende da intensidade. A força da paixão que fez vocês ficarem juntos vai ser o fiel da balança. A paixão do começo alimenta o amor depois. Portanto, aproveite. É o que revela as possibilidades e testa os limites do casal. Quem não foi louco na paixão não terá onde se segurar diante da normalidade da rotina. A paixão é o test-drive do amor. É um sentimento explosivo que surgirá novamente em cada briga ou indício de separação para esquentar os laços. Interessante pensar que os casamentos tristes são os mais duradouros. As pessoas não sentem ânimo nem para se separar. O tédio anula tanto a possibilidade de viver como de se matar. Ficam desanimados, não despertam inveja. O par não está no mundo para se perder. Marido e mulher não se envaidecem. São conformados e odeiam o final de semana. Acham que não encontrarão outro amor e, com pavor da solidão, não aceitam mudar. Já os casamentos felizes são os que têm mais chances de terminar. Que paradoxo, hein? Quem é entusiasmado vai interessar os colegas, atrair convites e receber cantadas. No casamento feliz, as brigas são mais freqüentes porque há maior transparência, mais tentativas de conciliar as diferenças. Um casamento não termina porque não é feliz. Às vezes termina para preservar a felicidade da memória.

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