Folha de São Paulo, Folhinha, 14/01/06:
MINHA PRIMEIRA VEZ
Pintura de Paul Klee
Fabrício Carpinejar
Não fui homem no momento
em que o rosto enrugou em barba.
Ou quando me alistei para servir.
Ou no primeiro beijo de boca.
Ou na primeira morte de um familiar.
Fui eleito homem aos nove anos,
chamado no corredor do nome
entre panelas na parede
e chapéus no cabide.
Meu vô me passou o facão e disse
para correr atrás da galinha ruiva.
Tentei agarrá-la
mas seus olhos ciscaram o vento.
As patas das asas agarraram o vento.
Ela escapou dos braços
e voou até o telhado.
Fiquei esperando ela descer.
A galinha se fez telha,
preenchendo as goteiras.
A galinha se transformou
em balde sem alça.
Um bule voadro.
Fiquei esperando ela descer.
As calhas acumularam chuvas
com a ninhada de ovos.
Os canos estouraram.
Estou esperando ela descer.
Tudo o que não enxergo
é relâmpago.
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
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