quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

11/18/2004 09:36:08 AM

PONCHO

Ilustração de Eduardo Nasi


Fabrício Carpinejar


Eu acreditava que Porto Alegre era meu pátio. Não saía de lá, entre abacateiros, bergamoteiras, porta de garagem que servia de gol, gaiolas de passarinhos e ratos, um vira-lata sem uma pata, caminhões de madeira, carretéis e uma mala cheia de adesivos de meu avô. Tinha cinco anos. Meus olhos eram caídos, desmanchados de verde. Eu sempre parecia triste mesmo quando estava rindo. Quando ria, os adultos de casa vinham me consolar pensando que chorava. Eu não entendia, mas aceitava o abraço dos adultos. Minha cabeça ficava na barriga deles e roncava barulhos de poço, de torneira seca. Eu usava um poncho. Poncho é uma coberta com furo em cima para colocar o rosto. É como uma saia do escocês onde o pescoço é a cintura. Minha mãe me obrigava a botar ceroula. Eu me sentia preguiçoso por ter um pijama debaixo da calça.


(Fragmento do livro infantil Porto Alegre e o dia em que a cidade fugiu de casa)

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