PARA DOIS
Gravura de Natalia Goncharova
Fabrício Carpinejar
Quero o vaso das mãos, vasos secos, para me desabituar de germinar junto às paredes. Vaso que não serve para alguma coisa, que é como um chapéu, bengala e guarda-chuva, que não se explica. Vaso sem flor que o justifique. Vaso com a própria terra dos dedos. Quem procura as melhores palavras para dizer ainda não está certo. Devemos procurar o melhor silêncio. Um silêncio que não silencia. Um silêncio de lado, sem importância. Não me esqueço do dia em que não fizemos nada, nada mesmo, parados, nos olhando de perto, rosto a rosto, sem enxergar nada, a não ser a respiração um do outro. Rindo a esmo, abraçados. A janela como um vinho aberto. O futuro passeando pela janela, confundindo vida e morte, uma criança e sua alegria incomunicável. Talvez tenha me visto contigo na infância ou na velhice. A pele macia como qualquer fruta depois da chuva. Nossos vícios perfeitos, nossas virtudes imperfeitas. O gorro de meus cabelos e tuas unhas. Minha vontade de puxar teu corpo como uma cadeira, tua vontade de colocar o casaco para dormir. Não importa em que tempo estávamos. A falta de palavras é também um idioma. O que se esforçou para viver não desaparece.
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
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