quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

11/2/2004 12:38:20 PM

FRAGMENTOS DE UM PALETÓ NO BRECHÓ

Gravura de Natalia Goncharova


Fabrício Carpinejar



Estou em crise, o que me ajuda a serenar. A maldade é uma espécie de paz. Ninguém permanece vivo por acaso. O que eu não consegui ser morre comigo. Com a enchente, o rio entrou pelos fundos e sentou ao redor da mesa do pátio. Debaixo do mar, os livros só têm ilustrações. Toda nudez é retroativa. A intimidade que comove é a que não é dita. A palavra diminui o valor. O sino fala como se uma árvore estivesse sendo cortada. Eu respiro como quem sobe uma escada. Apareceu um sono terrível, que não me lembro para sonhar de novo. Deveria pedir desculpa ao que sonhei para acordar a linguagem. Atravesso a rua para cumprimentar o sol. Os dentes resvalam na fruta e ficam para caroço. A solidão dos animais é muito acompanhada. Quando a casa encontra a velhice até os telhados se abrem como janelas. Desconfio das azeitonas, parecem uvas que não deram certo. Alarmar a mãe é um sinal de respeito. Nunca entendi para onde vai o desvio de septo. A experiência é uma sabedoria atrasada. Convido-me a me retirar.

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