quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

10/12/2005 11:49:26 AM

12 DE OUTUBRO


Fabrício Carpinejar






Minha primeira festa de aniversário aberta aos amigos aconteceu em 12 de outubro, onze dias antes da data oficial. Sempre quis receber uma caravana de presentes, depositá-los em uma caixa de supermercado e depois esparramá-los em minha cama. Presentes grandes como travesseiros de vó. Observar todos reunidos em torno do bolo, todos me invejando por estar ali no centro da mesa soprando as velas. Depois de longa insistência, ao completar cinco anos, a minha mãe convidou os colegas de turma. O meu nome no convite me deixou orgulhoso. Mais orgulhoso do que meu nome na certidão de nascimento. Havia centenas de doces e salgados, garfos de plástico e pratos de papel, guaraná, língua de sogra e balão. A família preparou a comida durante uma semana. Eu me vi vivo e não me acreditava. Lembro que vesti um macacão e uma camisa listrada. Na época, não usava pescoço. Minha cabeça rebolava solta nos ombros. Os cabelos foram penteados ao lado, acentuando a testa. O pai me emprestou sua loção pós-barba, que eriçou uma penugem imaginária. Às 17h, sentei na escada diante do portão de ferro para aguardar as pessoas. O portão de ferro, pesado. Meus olhos oblíquos e os olhos lisos da maçaneta. Escutava os passantes, as formigas se movimentando, os sapatos afobados passando pela casa e não entrando. Escutava minha própria ansiedade. "Será que me acordei no dia errado?" Contei os furos de meu cinto, seis. Estava no segundo. Contei os buracos de meu tênis, seis. Contei os botões de minha camisa, seis. Contei esconde-esconde e ninguém aparecia para bater no muro. Fui murchando o rosto na gola. Envergonhado pelos pais. Envergonhado pelos irmãos. "O que pensariam?" Às 18h, a mãe pediu para entrar. Eu gritei: "não, só mais um pouquinho. Tô ouvindo, tô ouvindo chegar". Ouvia as cigarras sacolejando a grama, as baratas escondidas nas garrafas, o murmúrio das correias de uma bicicleta. "Tô ouvindo chegar". Ouvia o escapulário indo de um lado para o outro nos seios de minha irmã. Mas o mundo não chegava. O portão de ferro escorria vento em seis frestas. Sei que me puxaram com força, me pegaram no colo, e não chorei de tanto que desejei chorar. Não chorei porque não podia. Não chorei pois a boca não ajudou. Fiquei mudo, embrulhado, adivinhando o que havia dentro de mim pelo barulho solto de alguma peça, de alguma lembrança, de algum menino.

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